SNARKs vs STARKs: Diferença, Vantagens e Uso

Nos últimos anos, as provas de conhecimento zero (Zero‑Knowledge Proofs – ZKP) ganharam destaque no universo das criptomoedas, especialmente por possibilitar privacidade avançada e escalabilidade. Entre as tecnologias mais discutidas, SNARKs e STARKs são frequentemente comparados, mas poucos entendem em profundidade suas diferenças técnicas, implicações de segurança e casos de uso práticos. Este artigo apresenta uma análise detalhada, voltada para usuários brasileiros que estão iniciando ou já têm algum conhecimento sobre cripto, explicando como cada solução funciona, quais são suas vantagens e limitações, e como escolher a mais adequada para diferentes projetos.

Principais Pontos

  • SNARKs (Succinct Non‑Interactive Argument of Knowledge) requerem um trusted setup e são mais compactos.
  • STARKs (Scalable Transparent ARguments of Knowledge) são transparentes, resistentes a ataques quânticos e produzem provas maiores.
  • Diferenças de performance: tempo de geração vs verificação, tamanho da prova e consumo de gas.
  • Aplicações reais no Brasil: projetos DeFi, NFTs e soluções de identidade digital.

O que são SNARKs?

SNARKs, sigla para Succinct Non‑Interactive Argument of Knowledge, são provas criptográficas que permitem a um provedor demonstrar a posse de um determinado conhecimento sem revelar o conteúdo desse conhecimento. Elas são succinct (sucintas) porque a prova gerada tem tamanho pequeno (geralmente alguns kilobytes) e a verificação é extremamente rápida, independentemente da complexidade da computação original.

Como funciona um SNARK?

O processo básico de um SNARK envolve três fases:

  1. Trusted Setup: um conjunto de parâmetros públicos e privados é gerado por um processo de ceremony. Este passo é crítico porque, se os parâmetros privados vazarem, a segurança da prova pode ser comprometida.
  2. Prova: o provedor utiliza os parâmetros públicos e sua computação secreta para criar uma prova que atesta a validade da afirmação.
  3. Verificação: qualquer verificador, apenas com os parâmetros públicos e a prova, pode confirmar a veracidade da afirmação em tempo constante.

Essas etapas são non‑interactive, ou seja, não há troca de mensagens entre provedor e verificador, o que simplifica a integração em blockchains.

Vantagens dos SNARKs

  • Provas muito pequenas: facilitam o armazenamento on‑chain e reduzem custos de gas.
  • Verificação quase instantânea: ideal para aplicações que exigem alta frequência de validações, como ZK‑Rollups.
  • Ampla adoção: projetos como Zcash, Aztec e alguns módulos do Ethereum já utilizam SNARKs.

Limitações dos SNARKs

  • Trusted Setup: a necessidade de uma cerimônia segura gera risco de confiança e pode ser um ponto de crítica.
  • Vulnerabilidade pós‑quantum: a segurança baseia‑se em problemas como o Elliptic Curve Diffie‑Hellman, que podem ser quebrados por computadores quânticos.
  • Complexidade de implementação: o desenvolvimento de circuitos aritméticos para SNARKs pode ser mais trabalhoso.

O que são STARKs?

STARKs, ou Scalable Transparent ARguments of Knowledge, são outra classe de provas de conhecimento zero que surgiram como resposta às limitações dos SNARKs. O termo “transparent” indica que não há necessidade de um trusted setup; os parâmetros são gerados publicamente a partir de funções hash criptográficas, eliminando o risco de comprometimento de chaves secretas.

Como funciona um STARK?

Um STARK utiliza três pilares principais:

  1. Polinômios de baixa taxa de erro: a computação original é convertida em um conjunto de polinômios que podem ser verificados de forma probabilística.
  2. Commitment via Merkle Trees: os valores são comprometidos em uma estrutura Merkle, permitindo provas de consistência.
  3. Desafio aleatório: o verificador gera um desafio aleatório que o provedor deve responder, garantindo a integridade da prova.

O resultado são provas maiores que as de SNARKs (geralmente dezenas a centenas de kilobytes), mas ainda suficientemente compactas para serem armazenadas em blockchains públicas.

Vantagens dos STARKs

  • Transparência total: elimina a necessidade de trusted setup, aumentando a confiança dos usuários.
  • Segurança pós‑quantum: baseia‑se em funções hash e problemas de aritmética de campo que são resistentes a ataques quânticos.
  • Escalabilidade: projetado para prover provas de computações muito grandes, como verificações de milhares de transações.

Limitações dos STARKs

  • Tamanho da prova: maior que SNARKs, o que pode encarecer as taxas de transação.
  • Tempo de geração: a criação da prova costuma ser mais custosa computacionalmente.
  • Menor maturidade: apesar de rápido crescimento, ainda há menos bibliotecas e ferramentas maduras comparadas aos SNARKs.

Comparação Técnica entre SNARKs e STARKs

Tamanho da Prova

SNARKs produzem provas de alguns kilobytes (tipicamente 2‑4 KB), enquanto STARKs geram provas que variam de 30 KB a 200 KB, dependendo da complexidade da computação. Essa diferença impacta diretamente o custo de armazenamento on‑chain e o consumo de gas nas transações Ethereum.

Tempo de Verificação

Ambas as tecnologias oferecem verificação rápida, mas os SNARKs costumam ser ligeiramente mais rápidos (milissegundos) devido ao tamanho menor da prova. STARKs, apesar de provas maiores, ainda mantêm verificação em poucos segundos, o que é aceitável para a maioria das aplicações de camada‑2.

Trusted Setup vs Transparência

O ponto mais crítico para projetos que valorizam descentralização é a presença ou ausência de trusted setup. Enquanto SNARKs exigem uma cerimônia (por exemplo, o Phase‑2 ceremony do Zcash), STARKs não têm esse requisito, tornando‑os mais atrativos para comunidades que desconfiam de autoridades centralizadas.

Resistência a Computação Quântica

SNARKs dependem de problemas baseados em curvas elípticas, vulneráveis a algoritmos quânticos como o de Shor. STARKs, por outro lado, baseiam‑se em funções hash e aritmética de campos que são consideradas seguras contra ataques quânticos, o que pode ser decisivo para projetos de longo prazo.

Consumo de Gas no Ethereum

Ao publicar uma prova on‑chain, um SNARK típico consome entre 20 000 e 40 000 gas, enquanto um STARK pode ultrapassar 100 000 gas devido ao tamanho maior da prova. Entretanto, projetos que utilizam rollups ou sidechains podem amortizar esse custo.

Facilidade de Desenvolvimento

As ferramentas de desenvolvimento para SNARKs, como circom e snarkjs, são mais maduras e contam com comunidades ativas. Para STARKs, bibliotecas como starkware e cairo ainda estão evoluindo, mas já permitem a criação de contratos inteligentes que verificam provas STARK.

Aplicações Práticas no Ecossistema Cripto Brasileiro

O Brasil tem se destacado no desenvolvimento de soluções DeFi, NFTs e identidade digital. A escolha entre SNARKs e STARKs pode influenciar diretamente a viabilidade econômica e a segurança desses projetos.

DeFi e Privacidade de Transações

Plataformas como Aztec Network utilizam SNARKs para oferecer transações confidenciais em Ethereum, permitindo que usuários ocultem valores sem sacrificar a auditabilidade. No Brasil, exchanges descentralizadas (DEX) podem adotar essa abordagem para cumprir regulamentos de anonimato.

Escalabilidade com ZK‑Rollups

Projetos de rollup, como Polygon zkEVM, empregam SNARKs para validar milhares de transações off‑chain e publicar uma única prova on‑chain. A compactação das provas reduz drasticamente os custos de gas, crucial para usuários brasileiros que operam com R$ 0,10 a R$ 0,20 por transação.

Identidade Digital e Verificação de Dados

STARKs são particularmente adequados para soluções de identidade que exigem transparência total e resistência a futuros ataques quânticos. Iniciativas como Credify podem usar STARKs para provar que um usuário possui certos atributos (ex.: maior de idade) sem revelar documentos sensíveis.

NFTs e Propriedade Intelectual

Ao registrar NFTs, alguns projetos buscam comprovar a originalidade de obras digitais usando provas ZK. STARKs permitem gerar provas de grandes processos de hashing (por exemplo, verificando toda a história de alterações de um arquivo) sem a necessidade de trusted setup, aumentando a confiança dos colecionadores.

Desafios e Futuro das Provas de Zero Knowledge

Embora SNARKs e STARKs já estejam em produção, ainda há desafios a superar:

  • Redução de custos: otimizações de algoritmos e compressão de provas são áreas ativas de pesquisa para tornar ambas as tecnologias mais econômicas.
  • Interoperabilidade: garantir que diferentes blockchains (Ethereum, Solana, Cardano) possam validar provas de forma padronizada.
  • Ferramentas de desenvolvimento: melhorar IDEs, depuradores e documentação para atrair desenvolvedores menos experientes.
  • Regulação: autoridades brasileiras podem exigir auditoria de provas ZK para combate à lavagem de dinheiro, exigindo transparência nos processos de geração de provas.

O futuro aponta para a convergência de ambas as abordagens. Projetos híbridos podem combinar a compactação dos SNARKs com a transparência dos STARKs, resultando em provas ainda mais eficientes. Além disso, novas inovações como Plonk, Halo e Fractal prometem eliminar o trusted setup sem sacrificar o tamanho da prova.

Conclusão

SNARKs e STARKs representam duas soluções avançadas para o desafio de provar informações sem revelá‑las, cada uma com seus pontos fortes e fracos. SNARKs oferecem provas extremamente compactas e verificação quase instantânea, mas exigem um trusted setup que pode gerar desconfiança. STARKs, por sua vez, garantem transparência total e segurança pós‑quantum, embora a um custo maior de tamanho de prova e tempo de geração.

Para o ecossistema cripto brasileiro, a escolha depende do caso de uso: se a prioridade é reduzir custos de gas e manter alta velocidade, SNARKs podem ser a melhor escolha; se a transparência e a resistência a futuros computadores quânticos são fundamentais, STARKs são mais adequados. À medida que as ferramentas evoluem e a comunidade ganha mais experiência, espera‑se que ambas as tecnologias coexistam, impulsionando a inovação em privacidade, escalabilidade e segurança nas finanças descentralizadas.