Riscos e recompensas do restaking: o que você precisa saber

Riscos e recompensas do restaking: o que você precisa saber

O universo das cryptomoedas evolui rapidamente, e uma das inovações que tem ganhado destaque no último ano é o restaking. Essa prática permite que usuários reutilizem seus ativos já em stake em novos protocolos, potencializando ganhos sem a necessidade de bloquear mais capital. Contudo, como toda estratégia financeira, o restaking traz consigo um conjunto de riscos que precisam ser compreendidos antes de colocar seu patrimônio em jogo.

Principais Pontos

  • Restaking permite redeploy de tokens já em stake para múltiplos protocolos.
  • Recompensas podem ser significativamente maiores que o staking tradicional.
  • Riscos incluem slashing, dependência de contratos inteligentes e vulnerabilidades de camada dupla.
  • Estratégias de mitigação: diversificação, auditorias de código e monitoramento constante.

O que é restaking?

Restaking, ou “re‑staking”, é a prática de alocar os mesmos tokens que já estão bloqueados em um mecanismo de consenso (como proof‑of‑stake) para participar de outro protocolo que oferece recompensas adicionais. Em vez de manter os ativos apenas na rede original, o usuário delega esses mesmos tokens a contratos inteligentes que os utilizam como garantia em serviços de DeFi, seguros descentralizados, ou até mesmo em novos blockchains que aceitam tokens de outra cadeia como colateral.

Definição e funcionamento

Imagine que você tem 10.000 ETH staked na rede Ethereum para validar blocos e receber recompensas de consenso. Um protocolo de seguros descentralizado, como o Cover Protocol, permite que você “re‑stake” esses mesmos 10.000 ETH como garantia para vender apólices de seguro contra falhas de contrato. O contrato do protocolo de seguros não retira seus ETH da rede Ethereum; ele simplesmente reconhece que você possui um direito de staking e utiliza esse direito como colateral virtual.

Do ponto de vista técnico, o restaking costuma ser implementado via wrappers ou tokenized stakes. Quando você delega seus tokens, o protocolo emite um token representativo (por exemplo, stETH ou rETH) que representa sua posição de staking. Esse token pode então ser usado como ativo ERC‑20 padrão, permitindo sua integração em outros contratos.

Como funciona na prática: exemplos de protocolos

A seguir, analisamos três casos reais que ilustram diferentes abordagens de restaking no ecossistema cripto.

1. Lido Finance (stETH)

Lido permite que usuários depositem ETH e recebam stETH, um token que representa a participação no staking da Ethereum. Esse stETH pode ser usado em plataformas de DeFi como colateral para empréstimos, ou em protocolos de yield farming que oferecem recompensas adicionais. Assim, o usuário ganha tanto a recompensa de consenso da Ethereum quanto as recompensas de farming.

2. EigenLayer (eigenDAOs)

EigenLayer introduz o conceito de restaking de validações para serviços de disponibilidade de dados (data availability) e segurança de contratos. Os validadores que já têm ETH em stake podem “re‑stake” esse mesmo ETH para garantir a operação de eigenDAOs, recebendo taxas de serviço em cima da camada de disponibilidade. O risco aqui inclui a possibilidade de slashing duplo caso o validador falhe em qualquer das camadas.

3. Rocket Pool (rETH)

Rocket Pool emite rETH como prova de participação na rede Ethereum. Esse token pode ser usado em protocolos de liquidez como Uniswap ou Curve, ou ainda em seguros descentralizados como Nexus Mutual. Ao combinar as recompensas de staking com as taxas de swap ou seguros, o usuário pode alcançar APYs (Annual Percentage Yields) superiores a 15% ao ano.

Principais recompensas do restaking

Os benefícios financeiros do restaking são atraentes, especialmente para investidores que buscam otimizar o retorno sobre o capital (ROIC). Veja as principais fontes de lucro:

  • Yield adicional: Ao alocar tokens tokenizados em farms, pools de liquidez ou seguros, o usuário recebe recompensas que são cumulativas à recompensa de consenso.
  • Diversificação de renda: Cada protocolo tem seu modelo de remuneração (taxas de swap, premiums de seguros, taxas de disponibilidade), o que reduz a dependência de um único fluxo.
  • Alavancagem de ativos: Como os tokens representam a mesma posição de staking, não há necessidade de comprar ativos adicionais, reduzindo a exposição ao risco de mercado.
  • Incentivos de rede: Muitas cadeias oferecem bônus para quem participa do restaking, como tokens de governança extras ou descontos em taxas.

Riscos envolvidos no restaking

Apesar das vantagens, o restaking pode expor o investidor a vulnerabilidades que não existem no staking tradicional.

1. Slashing duplo

Se o protocolo que recebe o token tokenizado sofrer um evento de slashing (penalidade por comportamento malicioso ou falha), o stake original pode ser afetado. Em alguns casos, o protocolo pode “re‑vestir” a penalidade, reduzindo o capital original.

2. Falhas de contratos inteligentes

Os contratos que recebem os tokens tokenizados são alvos frequentes de exploits. Uma vulnerabilidade pode resultar em perda total dos tokens representativos, que, embora não retirem o stake original da cadeia, podem impedir a recuperação de recompensas adicionais.

3. Risco de liquidez

Tokens como stETH ou rETH podem ter mercados secundários menos profundos que o ETH nativo. Em momentos de alta volatilidade, a venda desses tokens pode gerar slippage significativo, impactando o retorno final.

4. Complexidade operacional

Gerenciar múltiplas camadas de staking exige monitoramento constante, ferramentas de análise e, muitas vezes, a necessidade de interagir com várias carteiras ou contratos. Usuários menos experientes podem cometer erros, como delegar a endereço errado ou não retirar recompensas antes de um período de lock‑up.

5. Dependência de auditorias

Embora muitas plataformas passem por auditorias formais, a rapidez com que novos protocolos são lançados pode significar que as auditorias não cubram todos os vetores de ataque. A confiança cega em um contrato recém‑auditado pode ser perigosa.

Estrategias de mitigação de risco

Para quem deseja explorar o restaking sem comprometer a segurança do portfólio, seguem algumas boas práticas:

  • Diversificação de protocolos: Não concentre todo o stake em um único contrato. Distribua entre diferentes serviços (farm, seguros, disponibilidade).
  • Auditorias e reputação: Priorize protocolos que tenham auditorias independentes realizadas por empresas reconhecidas (Trail of Bits, OpenZeppelin, Quantstamp).
  • Monitoramento de slashing: Use dashboards como EigenLayer Monitor ou Lido Dashboard para acompanhar eventuais penalizações em tempo real.
  • Limite de exposição: Defina um percentual máximo do seu capital total que será alocado em restaking (ex.: 30%).
  • Liquidez de saída: Mantenha uma reserva em ativos de alta liquidez (USDT, DAI) para cobrir eventuais necessidades de resgate rápido.

Impacto fiscal no Brasil

Os ganhos provenientes do restaking são tributáveis segundo a legislação da Receita Federal. Cada tipo de recompensa (staking, farming, seguro) deve ser registrado como renda tributável ou ganho de capital, dependendo da natureza da operação. Em geral:

  • Recompensas de staking: Consideradas renda tributável no momento do recebimento.
  • Ganhos de swap ou farming: Tratados como ganho de capital, exigindo cálculo da diferença entre o custo de aquisição e o valor de venda.
  • Premios de seguros: Também enquadrados como renda, devendo ser declarados no mês de recebimento.

Recomenda‑se a contratação de um contador especializado em cripto para evitar inconsistências na declaração.

Casos de uso no mercado brasileiro

Alguns projetos nacionais já começaram a integrar o restaking em suas soluções. A Bitso, por exemplo, oferece um produto de “staking avançado” que permite ao usuário aplicar seus tokens BNB em farms de rendimento extra. Já a Foxbit lançou um serviço de seguros descentralizados que aceita stETH como colateral, proporcionando proteção contra perdas em exchanges.

Ferramentas e recursos recomendados

Para quem deseja iniciar no restaking, segue uma lista de ferramentas úteis:

  • DefiLlama – Monitoramento de APYs e pools de liquidez.
  • EigenLayer Dashboard – Visão geral de protocolos que aceitam restaking.
  • Lido – Emissão de stETH e integração com múltiplas DEX.
  • Rocket Pool – Emissão de rETH e pools de staking comunitário.

Conclusão

O restaking representa uma evolução natural da economia de staking, permitindo que investidores maximizem seus rendimentos ao reutilizar ativos já comprometidos com a segurança de uma rede. Contudo, a camada adicional de complexidade traz riscos que não podem ser ignorados: slashing duplo, vulnerabilidades de contratos inteligentes, risco de liquidez e desafios operacionais.

Ao adotar boas práticas de diversificação, auditoria e monitoramento, é possível equilibrar a relação risco‑recompensa e transformar o restaking em uma estratégia rentável dentro do portfólio de criptoativos. Como sempre, a educação contínua e a consulta a profissionais especializados – tanto em segurança quanto em tributação – são fundamentais para navegar com confiança nesse cenário em rápida evolução.