Como quase tudo pode ser transformado em um token na blockchain
Nos últimos anos, a palavra “token” deixou de ser sinónimo exclusivo de criptomoedas como Bitcoin e Ethereum, passando a representar uma nova forma de representar valor, direitos e até mesmo dados digitais. A tokenização, impulsionada pelos contratos inteligentes e pela descentralização, abriu caminho para que praticamente qualquer ativo – tangível ou intangível – possa ser convertido em um token na blockchain.
O que significa tokenizar?
Tokenizar é o processo de criar uma representação digital de um ativo real ou conceitual em uma blockchain. Essa representação, chamada de token, contém metadados que descrevem o ativo subjacente, bem como regras de transferência, propriedade e, em alguns casos, de governança.
Existem diferentes tipos de tokens:
- Tokens de utilidade (utility tokens): dão acesso a um serviço ou plataforma.
- Tokens de segurança (security tokens): representam participação em ativos financeiros e são regulados como valores mobiliários.
- Tokens não-fungíveis (NFTs): representam ativos únicos, como obras de arte digitais ou imóveis.
Independentemente da classificação, a base tecnológica – um contrato inteligente – permanece a mesma.
Por que quase tudo pode ser tokenizado?
A resposta está na combinação de três fatores-chave:
- Smart contracts: permitem codificar regras de negócios de forma automática e imutável.
- Interoperabilidade: padrões como ERC‑20, ERC‑721 e ERC‑1155 garantem que diferentes tokens possam interagir em múltiplas plataformas.
- Descentralização e transparência: a blockchain oferece um registro público, auditável e resistente a censura.
Essas características criam um ambiente onde a digitalização de praticamente qualquer coisa se torna viável.
Exemplos de tokenização no mundo real
1. Ativos financeiros
Já são comuns tokens que representam ações, títulos corporativos ou dívidas. Empresas podem emitir tokens ERC‑20 que funcionam como ações digitais, permitindo negociação 24/7 e redução de custos de custódia.

2. Imóveis
Plataformas como RealT e Propy demonstram como um apartamento pode ser fracionado em dezenas de tokens, permitindo que investidores comprem pequenas cotas e recebam renda de aluguel automaticamente.
3. Propriedade intelectual e arte
Artistas digitais utilizam NFTs (ERC‑721) para vender obras únicas, garantindo royalties automáticos em cada revenda. Essa prática está mudando a forma como músicos, fotógrafos e escritores monetizam seu trabalho.
4. Dados e atenção – a tokenização da atenção
O conceito de tokenização da atenção transforma o tempo que usuários gastam em plataformas digitais em um ativo mensurável e negociável. Projetos como o Basic Attention Token (BAT) já pagam usuários por visualizarem anúncios, criando um ecossistema onde a própria atenção se torna moeda.
5. Serviços públicos e governamentais
Governos estão explorando a tokenização para melhorar a transparência e a eficiência. Veja o artigo Casos de Uso de Blockchain no Setor Público que detalha iniciativas de identidade digital, registro de propriedades e votação eletrônica. Outro recurso essencial é como a blockchain pode melhorar a transparência governamental, permitindo que cidadãos acompanhem gastos públicos em tempo real.
Como funciona na prática: etapas da tokenização
Transformar um ativo em token envolve um processo estruturado:
- Identificação do ativo: definir claramente o que será tokenizado (ex.: um imóvel, uma ação, um direito de uso).
- Modelagem de tokenomics: decidir tipo de token, quantidade, divisibilidade e regras de governança.
- Desenvolvimento do contrato inteligente: codificar as regras usando padrões como ERC‑20 (fungível) ou ERC‑721/1155 (não‑fungível).
- Auditoria de segurança: garantir que o contrato não contenha vulnerabilidades que possam ser exploradas.
- Emissão (minting): criar os tokens na blockchain e distribuir aos participantes.
- Listagem e liquidez: integrar o token a exchanges ou marketplaces para que possa ser negociado.
Para ativos que dependem de dados externos – como preços de commodities ou resultados de eleições – os oráculos (ex.: Chainlink) fornecem informações confiáveis à blockchain, fechando o loop entre o mundo físico e o digital.

Desafios e considerações legais
Apesar do potencial, a tokenização enfrenta obstáculos:
- Regulamentação: autoridades ainda estão definindo como classificar tokens de segurança, utilidade e NFTs. Cada jurisdição pode exigir licenças diferentes.
- Privacidade: blockchains públicas são transparentes, o que pode conflitar com leis de proteção de dados (ex.: LGPD).
- Custódia e interoperabilidade: armazenar chaves privadas de forma segura e garantir que tokens possam ser movimentados entre diferentes redes.
- Aceitação de mercado: a liquidez depende da adoção por investidores e plataformas.
Consultorias jurídicas especializadas e parcerias com provedores de compliance são essenciais para mitigar riscos.
Impacto nos negócios e na sociedade
A tokenização pode transformar modelos de negócio:
- Descentralização de acesso ao capital: startups podem levantar fundos vendendo security tokens a investidores globais, sem intermediários.
- Novas fontes de receita: artistas ganham royalties automáticos via NFTs; criadores de conteúdo são pagos por atenção tokenizada.
- Eficiência operacional: cadeias de suprimentos podem registrar cada etapa como token, reduzindo fraudes e atrasos.
- Inclusão financeira: pessoas sem acesso a bancos podem usar tokens como reserva de valor ou meio de pagamento.
Essas mudanças criam oportunidades, mas também exigem que empresas repensem governança, compliance e relacionamento com clientes.
Estrategias para quem quer começar a tokenizar
- Mapeie o ativo: entenda as características legais, de propriedade e de valor.
- Escolha a blockchain certa: publique em redes com alta segurança (Ethereum, Solana, Polygon) ou em cadeias permissionadas para casos corporativos.
- Desenvolva um MVP: crie um protótipo com poucos tokens para validar a aceitação do mercado.
- Construa parcerias: trabalhe com auditorias de segurança, provedores de oráculos e exchanges.
- Eduque seu público: publique whitepapers, webinars e guias – a confiança é crucial para adoção.
Conclusão
A tokenização está redefinindo o conceito de propriedade. De ativos financeiros a atenção humana, quase tudo pode ser convertido em um token, trazendo transparência, liquidez e novas formas de monetização. No entanto, sucesso depende de uma combinação de tecnologia robusta, compliance regulatório e aceitação de mercado. Empresas e investidores que entenderem esse ecossistema e adotarem boas práticas estarão à frente da próxima revolução digital.
Para aprofundar ainda mais, recomendamos a leitura de Casos de Uso de Blockchain no Setor Público e como a blockchain pode melhorar a transparência governamental. Também vale conferir fontes externas como Coindesk – Tokenization Explained e a documentação oficial da Ethereum Token Standards para obter uma visão técnica mais aprofundada.